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sábado, 3 de outubro de 2015

coluna Gente Fronteiriça - Memórias de um teatro

Por Carlos José de A. Machado

Não sei precisar o dia e o mês, mas sei que foi pouco antes de junho de 1974, quando com oito anos incompletos entrei pela primeira vez naquele amplo teatro, que nunca havia imaginado existir na minha cidade. Fui com minha escola, na época o Grupo Escolar Joaquim Caetano da Silva assistir apresentações das turmas, com a professora Isolda Perez. No palco algumas apresentações homenageando a seleção brasileira que estava pra disputar a copa de 1974. Assistia tudo encantado, não sei se com as apresentações ou com a imensidão daquele prédio. Meu irmão mais velho com nove anos apresentava-se no palco em um jogral, o que me fez pensar: eu também quero me apresentar ali. Mas, naquele palco, levou um bom tempo pra que isso se concretizasse, quando em 1992 lá estava eu me apresentando numa peça de teatro, e depois em 1995 ganhando a fase regional de Teatro Amador do RS. Lembro que, naquele palco, olhando aquela plateia, me lembrei de meus oito anos (coisa que já havia, ou pensei, ter deixado pra trás). A novidade já não era tão imensa como quando temos oito anos de idade, mas era uma situação que me trazia felicidade.

Quando me deparei com a obra “Olhares de Jaguarão” de Eduardo Alvares de S. Soares e Sergio da Costa Franco (2010), um mundo de minha cidade se abria ali, onde pude ir comparando com o que “diziam” os livros e cadernos escolares. Mas, aqui neste momento, me deterei num relato de Vilmar José Silveira de Lima, da obra referida, do inicio dos anos de 1950, que me fez relembrar aquela minha passagem citada, do início dos anos 1970, momento em que pela primeira vez entrei em contato com o Teatro Esperança.

Mas ir ao amplo Cine Teatro Esperança, em Jaguarão, era um acontecimento social pelo desfile de elegância das famílias e casais como fecho e ponto alto de cada semana. Em seu palco tive a honra de participar de peça teatral encenada com alunos da escola primária que eu cursava, o Grupo Escolar Joaquim Caetano da Silva.” (Franco e Soares, 2010, p.135)

Estas e outras memórias é que fazem este teatro ser considerado Patrimônio da cidade, e lembrado sempre que é perguntado sobre que bens poderiam representar a cidade de Jaguarão. Vejamos que o patrimônio acaba se tornando uma prática de memória obedecendo a um projeto de afirmação de si mesma, conforme o antropólogo Joel Candau. Aqui, a memória de minha cidade, a memória de seu teatro, que é um efetivo lugar de memória.

Edição de 30/09/2015 Ano VI nº 232





quarta-feira, 29 de julho de 2015

Coluna Gente Fronteiriça- Inauguração do Teatro Esperança: 1897 ou 1898

Por Carlos José Maninho

Esta questão me instiga há algum tempo e vinha à tona cada vez que eu precisava citar a data, por conta dos documentos existentes e de artigos em jornais e até alguns livros que suscitavam a dúvida. E, como sempre era citado 1897, inclusive em duas obras de Lothar Hessel, também seguia esta data quando apresentei o projeto de pesquisa para meu mestrado. Um ex-aluno, hoje professor de história, Carlos Otoniel Pacheco da Cunha fez uma excelente apresentação na defesa de seu TCC em 2014, na Unipampa, onde levanta esta questão. Talvez para não contrariar alguns documentos existentes e até autores como Lhotar Hessel, a indicou como hipótese. Aqui, quero ampliar e apresentar como efetivamente a data correta 13 de janeiro de 1898 e não no ano de 1897.

A data de inauguração suscitou uma confusão, a qual foi reproduzida por órgãos da imprensa além de outras publicações que se basearam nestas informações. Por isso, encontramos em algumas bibliografias e publicações apontando o ano de 1897 como a data correta. Um parecer do então Conselho de Desenvolvimento Cultural do Rio Grande do Sul (1990), quando do processo de tombamento pelo Estado, também ratifica o ano de 1897. Data também apresentada na edição de 24 de abril de 1983 do Jornal Correio do Povo, e também na da obra “O Teatro no Rio Grande do Sul” de Lothar Hessel (1999). Ainda, em um evento importante como foi a municipalização do Teatro Esperança, em 1997, foi comemorado o seu “centenário”, obviamente, todos baseados nas informações apresentadas em publicações nos jornais locais.

No entanto, a partir de uma análise sobre a documentação existente, não tenho dúvidas quanto a este equívoco, causado possivelmente, em função do Relatório da prestação de contas do primeiro ano de funcionamento do teatro (1898), onde na página 04, encontramos a seguinte afirmativa: "teve lugar a inauguração em 13 de janeiro do ano p.p. (próximo passado) com grande sucesso e bom resultado". Porém, o relatório é apresentado aos acionistas em 20 de janeiro de 1899, portanto o ano "p.p." se refere a 1898.

Ainda, para uma possível inauguração em janeiro de 1887, sendo que as obras foram contratadas em agosto de 1896, teríamos somente quatro meses para terminar um prédio de grande porte que contava apenas com "quatro paredes mestras e uma interior de material, sem reboco (...) coberto de telha, sem portas, nem janelas, nem assoalho (Publica Forma, 1893). Informações também levantadas por CUNHA. Soma-se a isto o registro do jornal "A Ordem" em 14 de janeiro de 1898, ou seja, um dia após a inauguração:
De grande sucesso foi o dia de ontem para a população de Jaguarão. (...) A ansiedade de ver funcionar o elegante edifício, o desejo de apreciar uma companhia completa e que vinha precedida de justo renome superaram todas as dificuldades, e as populações das duas margens afluíram ontem ao Esperança para assistirem à inauguração deste e à estréia da Companhia Cartocci & Cia”. (Jornal A ORDEM, 14/01/1898. Grifo do autor)


Por fim, se fizermos uma análise mais detalhada sobre o Relatório e Ata nº 01 da Associação do Theatro Polyteama Esperança (1888) chegaremos a esta conclusão. Assim, inaugurou-se o teatro com a ópera “Trovador”, em 13 de janeiro de 1898, à que se seguiram outras seis óperas e várias operetas. A temporada operística durou um mês, apenas encerrada em 03 de fevereiro. Durante o primeiro ano de funcionamento foram realizados 103 espetáculos, conforme o Relatório da Associação. Os documentos citados podem ser encontrados no Instituto Histórico e Geográfico de Jaguarão e esta edição do Jornal A Ordem no Museu de Comunicação Social Hipólito José da Costa em Porto Alegre. 

 Edição de 22/07/2015 Ano VI nº 222



quinta-feira, 18 de junho de 2015

Coluna Gente Fronteiriça - As políticas públicas para o patrimônio em Jaguarão - II

Por Carlos José Maninho

Dando continuidade ao texto desta coluna de 14 de maio sobre o Projeto Jaguar do inicio dos anos 80. Que importantes frutos desse Movimento germinaram nas últimas duas décadas do século XX!

Vamos a eles: Um convênio entre Prefeitura e Ufpel (1987), que leva ao surgimento posterior do PRIJ - Programa de Revitalização Integrada de Jaguarão (1992). Ainda em 1987 foi fundada a SIC, Sociedade Independente Cultural, com forte influência deste movimento e que vai protagonizar atividades importantes na área cultural, e servir de base para a equipe da gestão de Cultura em 2009. Em 1990 a cidade teve 04 prédios tombados pelo IPHAE (Teatro Esperança, Ruínas da Enfermaria Militar, Igreja Divino Espírito Santo e Casa de Cultura). Em 1997 começa o processo de municipalização do Teatro Esperança, que completou 100 anos em 1998. A partir daí, a linha histórica já mais afastada daquele movimento inicial segue, porém tocando naqueles pontos já levantados no Projeto Jaguar. Mais recentemente o projeto de Turismo na Costa Doce formatou em Jaguarão o primeiro dos Roteiros de Arquitetura e iniciou em 2005 a promoção de um encontro anual sobre arquitetura, turismo cultural e preservação, o Seminário de Arquitetura de Jaguarão. Em 2006 é fundada a Universidade Federal do Pampa, onde Jaguarão é contemplada com um Campus desta instituição, o que irá potencializar a cidade e região do ponto de vista cultural. Em 2009 vem o lançamento da obra "Roteiros de Arquitetura da Costa Doce - Rio Grande do Sul" organizada por Luiz Antônio Custódio, Ceres Storchi e Vlademir Roman, trazendo um panorama sintético e visual do patrimônio da cidade, oriundo desta última movimentação.

Com a mudança da Gestão municipal em 2009, a Secretaria de Cultura e Turismo é desmembrada do Desenvolvimento Econômico, e o grupo que assumiu esta pasta tinha influência direta do Projeto Jaguar e da SIC. Este é um fator importantíssimo para que um setor público de cultura possa ter êxito, e especificamente aqui o patrimônio cultural: Pessoas que tenham envolvimento direto com a questão patrimonial, e estejam abertas ao debate público. Por isso, é um momento onde os passos se dão de forma mais acelerada para a consolidação de políticas públicas para o Patrimônio Cultural, dando sequência a uma nova fase deste processo que vinha caminhando positivamente, mas a passos mais lentos desde o final dos anos 80. Neste novo momento a gestão pública conseguiu juntar alguns quadros ligados ao movimento cultural associados ao conhecimento técnico em algumas áreas. Isto, associado a vontade de colocar em prática políticas públicas que dessem conta desta riqueza patrimonial que a cidade possuía, levou o município a dialogar mais diretamente com o IPHAN. Em abril (2009) organizou-se o Fórum de Patrimônio Histórico e Cultural de Jaguarão, em parceria com aquele órgão. A partir daí, aconteceram muitos outros encontros, destacando o Seminário Internacional do Bioma Pampa, em abril do mesmo ano, e a criação da Associação das Cidades Históricas do Rio Grande do Sul. Neste mesmo ano selou-se a parceria entre IPHAN e Prefeitura Municipal para o Centro de Interpretação do Pampa nas antigas ruínas militares. Porém mais do que isto, foi estabelecido outra parceria, desta vez com a Unipampa, onde esta se responsabilizará pela Gestão do Centro de Interpretação do Pampa, bem como os procedimentos futuros para sua revitalização.

Para deixar mais claro esta “aceleração”, que também foi possível pela mudança da conjuntura nacional a partir de 2002, citarei alguns acontecimentos: a restauração do Teatro Esperança que está sendo concluída nos próximos três meses; Em 2011 o tombamento nacional do Centro Histórico de Jaguarão; Em 2012 o tombamento Binacional da Ponte Internacional Mauá e ainda em 2013 teve 11 projetos aprovados pelo PAC das Cidades Históricas, que totalizarão 40 milhões de reais; Ainda, com os debates com grupos que não tinham maior visibilidade como aqueles ligados a religiosidade afro-brasileira, também se despertou as atividades relacionadas às festas de Iemanjá e São Jorge, tradicionais porém se encontravam invisíveis para muitos jaguarenses. Nos últimos três anos já tivemos duas visitas de Ministros da Cultura, sendo a última no mês passado, num evento do Mercosul, tendo a presença da Ministra de Educação e Cultura do Uruguai, além de autoridades de outros países do bloco. Por fim, a criação do Conselho Municipal de Politicas Culturais é outro exemplo deste momento importante para a cidade neste campo.


Concluindo, entendo que neste processo de discussão patrimonial em Jaguarão, que começou a tomar fôlego no início da década de 80, e que veio lenta e gradualmente se construindo nas duas décadas posteriores, vai ter uma efetividade maior quando se partiu para um pensar e uma prática governamental e não governamental que implicou a busca de participação de vários grupos envolvidos com o tema, e a vontade, incomum em gestões, de colocar a cultura como tópico principal em suas políticas públicas.

Edição de 10/06/2015 Ano VI nº 216




quinta-feira, 14 de maio de 2015

Coluna Gente Fronteiriça - As políticas públicas para o patrimônio em Jaguarão - I

Grupo Americando após apresentação no 
Teatro Esperança, no Projeto Jaguar (1983)

Por Carlos José Maninho

As primeiras discussões em relação às políticas públicas para o patrimônio remetem ao início dos anos 80, conturbado período político-econômico, onde vivia-se os últimos anos da ditadura militar. Não se pode dizer o mesmo com relação ao debate das políticas patrimoniais, pois o Brasil, sofreu uma influência positiva dos debates sobre o Patrimônio oriundos da ONU e do Ano Europeu do Patrimônio (1975).

Dentro deste contexto nacional na década de 70, os debates fomentados pela sociedade civil em Jaguarão gestaram projetos que levaram adiante ações que resultaram no levantamento arquitetônico dos prédios da cidade, na forma de inventário, com vistas à preservação do patrimônio. O projeto considerado “pioneiro”, desenvolvido no começo dos anos 80, denominado “Jaguar”, englobou diversas ações além do inventário, entre elas a utilização de espaços culturais como o Teatro Esperança e a valorização das ruínas da Enfermaria Militar. 

Nesta longa caminhada, os primeiros registros de uma preocupação com o Patrimônio histórico e arquitetônico da cidade se dão neste período e contaram com mobilizações e movimentos da sociedade civil que chamavam a atenção para a necessidade de revitalização de nossos prédios, espaços públicos e locais de interesse cultural. 

Assim começa a tomar corpo a ideia de revitalização de Jaguarão. Podemos citar o Plano Diretor da cidade de 1979 que definia a preservação do entorno da Praça Alcides Marques, mas se resumia a esta área. Efetivamente, as primeiras movimentações neste campo vão se dar através de ações não governamentais como o Projeto Jaguar, no ano de 1982, movimento que irá influenciar muitas pessoas e entidades da comunidade. Após a primeira eleição depois da Ditadura (1985), o prefeito eleito, Fernando Correa Ribas, entusiasmado com a movimentação deste projeto, institucionaliza algumas atividades e começa a organizar a revitalização das Ruínas da Enfermaria, acarretando a criação de um parque no local. Com a morte deste prefeito em um acidente automobilístico o parque acabou levando seu nome. Porém na década de 90 as novas gestões acabam gerando um novo e forte abandono deste local. Contudo, importantes frutos do Projeto Jaguar germinaram nas últimas duas décadas do século XX. Apresentarei este processo na minha próxima participação nesta coluna.

Edição de 06/05/2015 Ano VI nº 211
 




quinta-feira, 23 de abril de 2015

Coluna Gente Fronteiriça - Breve História da SIC

Por Carlos José Maninho

Seu nascimento dá-se em 16 de fevereiro de 1987, alimentada pelo desejo de alguns ativistas culturais em acordar a cidade para a sua riqueza cultural, incluindo seu patrimônio tanto material e imaterial. Destaco aqui o trabalho do Maestro Jarbas Taurino, que na época lançara um manifesto de chamada a todos que comungassem da ideia de revitalização cultural. E de inicio, com a criação do Coral Independente, Jarbas Taurino fica em Jaguarão até 1989, militando firme na construção desta entidade, juntamente com a Professora Eloisa Timm, outra entusiasta pela Cultura e Educação além de outros abnegados ativistas, que não citarei aqui para não deixar de fora nenhum nome. Taurino, hoje, reside e trabalha em São Paulo como Professor Universitário e Maestro. Eloisa faleceu em 2010, mas nos deixou um legado muito importante, além de filhos que nos brindam constantemente com sua arte maravilhosa de compor, tocar e cantar.

Numa conjuntura em que a cidade ainda respirava os ventos de tempos ditatoriais, que aos poucos vai se dissipando, porém, do ponto de vista governamental, ainda precisou andar alguns anos para que este setor absorvesse a ideia de ajudar a acordar culturalmente esta cidade que estava adormecida. A SIC já havia nascido com este propósito, influenciada também pelos ventos do Projeto Jaguar que agitou a cidade no comecinho dos anos 80. Em 1985 tivemos, na cidade, a primeira eleição direta do Executivo, depois da ditadura (Jaguarão era considerada Zona de Segurança Nacional, e não havia eleição de gestores). Surgiu o primeiro Coral Municipal sob a regência do Maestro Jarbas Taurino, afastado de suas funções por pressão de cunho político em função de suas ideias. Não por acaso, dois anos depois surge a SIC e seu Coral Independente.

Desta data em diante a entidade vem se fazendo ouvir através dos mais variados eventos culturais. Recebeu, na época, o título de Utilidade Pública Estadual e Municipal pelas seus objetivos culturais. Também foi a primeira entidade na cidade a estar cadastrada na primeira Lei de Incentivo à Cultura (em 1988). Promotora de Projetos como Jaguararte (92-93; 2005, 2006, 2007 e 2009), aguardando a reinauguração do Teatro Esperança, possivelmente no próximo mês de junho, para seguir adiante. O Coral Independente (se manteve até 90), o grupo Cênico Contranestesia (onde a peça “Nuestra América” ficou entre os cinco melhores trabalhos do teatro amador do RS em 95); os tradicionais Seminários Sócio-Culturais e outros internacionais, vale dizer num período quando não existia a Unipampa em Jaguarão. Destaca-se ainda a Mostra “Canto do Jaguar”, já com três edições, no qual foi lançado um CD do 2º Canto (1º CD de um evento de Jaguarão). Além destes, promovemos exposições, colóquios, Lançamentos de livros e CD's e estivemos presentes em vários eventos realizados por outras entidades privadas ou públicas.

A SIC tem se destacado por envolver em alguns de seus eventos artistas e escritores do Brasil, Uruguai e Argentina. Tem sido parceira em vários eventos que envolvam artistas e escritores de Jaguarão. Nesta última gestão, estivemos à frente do Lançamento do CD Singular, na Biblioteca Pública (2013), do livro “Sobre amores e outras utopias” de Martin Cesar, e ainda em 2013 protagonizamos o 1º FALA (Feira Alternativa de Literatura e Artes). Em 2014 lançamos o Show Solamente Yo, de Jarbas Tauryno, e promovemos os Shows de Pedro Munhóz e de Paulo Renato. Participamos do evento de Descomemoração do Golpe de 64, além de participar como coorganizador do 7º e 8º Sarais Poéticos, bem como da Feira Binacional do Livro.

Hoje a SIC esta situada no Prédio histórico do Círculo Operário de Jaguarão. Todo sócio é um incentivador cultural, por isso, para que esta entidade continue atuando firme neste caminho, sua colaboração é muito importante. Com apenas uma anuidade, hoje de R$20,00 o sócio vem ajudando a cultura em nosso município.

Fica o convite para todos os amantes da cultura participarem da Assembleia Geral a ser realizada no Auditório do Círculo Operário, às 19 horas, do próximo dia 30.

Edição de 15/04/2015 Ano VI nº 208






sábado, 21 de março de 2015

Coluna Gente Fronteiriça - Alguns são todos, ou todos são alguns?

Por Carlos José  de A. Machado
Trabalhar com a lógica as vezes nos traz algumas informações bem legais. Num conjunto de 15 cães, 3 são ferozes e maldosos (faz de conta que um cão tem esta característica). Posso dizer que todo o conjunto é feroz e maldoso? Não, seria uma sacanagem com os 12, que inclusive são maioria. E se dizer que todos não são ferozes e maldosos? Também seria sacanagem com os demais de fora, além de acobertar os ferozes e maldosos. A lógica é clara (e usamos em vários conhecimentos, muito comum na matemática). "Alguns não são todos, e todos não são alguns". Quando damos aulas aos alunos do Ensino Fundamental e Médio, é comum, às vezes, colegas comentarem sobre determinada turma, em função de alguns alunos "bagunceiros". Tipo, "aquela turma não dá pra trabalhar", "é horrível". Pronto, transformamos o "alguns no todo". E isto é ruim pra quem? Para aquela maioria que não era "horrível" como se propagava com este discurso, mas pagava o pato. 

O objetivo aqui não é tratar de como os professores devem agir numa situação destas, mas demonstrar como, por falta de uma compreensão elementar de lógica, sacaneia-se muitas pessoas de bem. O senso comum, apesar de ser por onde devemos começar uma análise, é provido de vários preconceitos (conceitos prévios, não provados, portanto não verdadeiros). E também por operações lógicas desatentas. Uma delas é justamente esta: Confundir Alguns com Todos, e Todos com alguns.
Hoje, e de muitos anos, pois já abordava isto lá pelos idos de 1989, no campo da política, há grupos de pessoas alicerçadas por grupos de Mídia (TV, Rádio, Jornal), que alimentam esta terrível argumentação totalmente desprovida de lógica. Vejamos: quando algumas pessoas (políticos) se corrompem, e como é possível corromper individualmente, não há necessidade do todo, no caso os partidos. Estes apenas tem suas Comissões de Ética para tratar do assunto e suas propostas e bandeiras, que é onde as pessoas poderiam e deveriam estabelecer os debates, defendendo ou combatendo (ideias) de um lado ou outro.

Assim, se uma agremiação tiver milhares de membros, e 5 ou 8 forem corrompidos ou corruptores, eu posso dizer que "Alguns são todos". Da mesma forma não. Assim, apenas estaremos sacaneando os corretos, e ainda ajudando os corruptos a se esconderem no meio de todos. Por isso não gosto destas generalizações, que a própria lógica demonstra, não resolvem o problema. Neste caso, teríamos que verificar onde estão as situações mais propícias para a corrupção. Uma delas está bem clara. Financiamento privado por grandes grupos econômicos a candidatos, que eleitos, estão sujeitos a defenderem os interesses destes grupos (até aí, ainda não se configura exatamente a corrupção, mas a opção de lado). Mas em determinado momento em que estas empresas tem interesses em licitações por exemplo, aí sim, percebemos como funciona o causo. E uma vez investigados nomes que, por ventura, possam estar envolvidos, e uma vez comprovados, será que podemos concluir que "Todos são Alguns". 

Esta noção do senso comum, muito apreciada e difundida justamente por grupos econômicos que operam com a corrupção, ajuda em muito a manter os corruptos quase a salvo, no meio de todo o conjunto. Enquanto não aprendermos a dar nome aos bois, de todos os lados, e evitar generalizar para todo o conjunto, também se estará ajudando os corruptos. O importante na política é debater os projetos, sem preconceitos ou lógicas falsas. Defender isto ou combater isto, por conta disso e disso. Pressionar o governo tal para encaminhar tal projeto. De outra forma, ajudar-se-á a manter a situação como está. Em muitas manifestações pairou o senso comum principalmente através da Rede Globo, já que a Reforma Política praticamente não foi apresentada como tema fundamental, porém a ideia de que "Alguns são todos", sim, é o que mais percebi, e pior, de um lado só. Além da falsa lógica que ajuda a corrupção, ainda tem a parcialidade. 

Edição de 18/03/2015  Ano IV nº 204


  

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

Coluna Gente Fonteiriça - Reflexões Fundamentais

Por Carlos José de A. Machado

O imediatismo do cotidiano de nossas vidas acaba levando muitas pessoas a não usarem a capacidade de utilização de uma arma fundamental para a transformação da própria existência.  A possibilidade de enxergar além daquilo que parece ser, de redirecionar nossa vida se assim for necessário. É pensar novos caminhos e não acreditar que é impossível.     

Existe uma parábola que nos ajudará a entender onde quero chegar “Havia uma corrida de sapinhos onde o ganhador seria condecorado com uma grande premiação.  Mas o público que estava ao redor (achando impossível os sapinhos chegarem  até o final da pista sem desistirem,  uma vez que era muito longa) gritava e ironizava os sapinhos: - Vocês não vão conseguir, vocês não vão conseguir....   E pouco a pouco cada sapinho ia desistindo. Permanecia apenas um. Que, parecendo não dar bola para o que o senso geral dizia, seguiu em frente até chegar ao final.  Foi aí que todos perceberam que o  sapinho em questão não os escutava pois era surdo.”

Ora, é assim que muitos de nós, homo sapiens agimos.  Acreditamos que isso e aquilo é impossível.  Por isso é preciso, eventualmente, pararmos e “taparmos nossos ouvidos e olhos” tão acostumados com o dia a dia, e refletir sobre os acontecimentos.  É necessário utilizar aquela arma que citei, que nada mais é do que a Reflexão Filosófica.  Pensar de forma radical, rigorosa e global sobre os fenômenos que acontecem (para usar um conceito da filósofa Marilena Chauí). 

É claro que não precisamos direcionar esta nossa arma para tudo. Mas é fundamental, de vez em quando, utilizá-la com vigor. Claro que,  sem dúvida,  no nosso IMEDIATISMO  seria uma coisa quase “impossível” (não é mesmo?),  uma vez que não paramos para as coisas MEDIATAS (que servem a um propósito maior, ou a um alcance um pouco mais adiante).  O normal é pensarmos: “Quando não tiver nada pra fazer aí então eu paro para  uma reflexão deste gênero”.  Só que aí já poderá ser tarde ou nossa vida já ter andado um longo caminho sem melhoras substanciais.   E daí, acaba-se vivendo “a vida que nos é dada, da forma que nos é colocada”, o que não nos difere de forma significativa dos demais primatas.  

Estas pequenas grandes paradas para a reflexão filosófica é que servem para as grandes transformações de nossa vida, de nosso cotidiano e de nosso mundo.   Se isto não for importante então realmente, não precisamos da FILOSOFIA.  Afinal não “vamos conseguir”, certo?

Edição do dia 04/02/2015 - Ano IV- nº 199