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quarta-feira, 25 de março de 2015

Em letras e números, o lado escuro do terceiro turno - por vicentepimenetero

O oportunismo imediato de uma minoria derrotada pelo PT junto à luta de classes em mais uma eleição, não mediu forças, inteligência, e muito menos argumentos cognitivos à sua revolta. Numa trapalhada estratégia de pressionar o governo tentando atiçar a força popular e a camada pensante da sociedade, que não é pouca, utilizou-se da implacabilidade quase letal da mídia, e do financiamento empresarial/partidário, fazendo alarde e levando às ruas um inexpressivo número de pessoas, tratando-se da gigantesca população de habitantes da velha República das Bananas. Um para duzentos e dois, na língua das apostas. O passado domingo vai ficar para a história do deboche contracultural, mas não evitará que mais adiante alguns governos venham a elevar esta data como forma de vitória, como assim o fizeram em datas vergonhosas que comemoramos até hoje, com esmero e dedicação. O que se viu no domingo passado foi um reality show que misturou, a programação nobre da tv sensacionalista, entendam-se como as três maiores emissoras televisivas no arquivo confidencial e a novela do tititi da vida, juntamente com o resgate do brasilianismo, movimento gerado lá nos anos 30, quando a academia científica norte americana enviou seus jovens para deliberadamente começar a implantar seu ímpeto de domínio através de suas espionagens perante a soberania de resguardo da cultura nacional, e por fim, uma parcela esquizofrênica, típica dos vivos mortos que habitam os centros das grandes metrópoles na claustrofóbica prática de venerar o sistema. Contudo ali, também nascia a manipulação da maneira de ver nossas próprias culturas, numa alquimia da americanização das coisas, isso, notoriamente, até os dias de hoje (busque brasilianismo não se acanhe).

Enquanto se construía e se constrói, ao longo destes últimos 12 anos, um Brasil com invejáveis avanços sociais, o que a priori revelava um país representado pelas inúmeras desigualdades, uma massa, porém pequena para o tamanho do povo brasileiro, urge em descontrole intelectual pelas ruas do país, contraditoriamente, batendo cabeça no mais sórdido financiamento midiático que já se viu. Nas principais avenidas e costeiras de algumas cidades e em algumas partes do território nacional, perceberam-se as infinitas sequelas deixadas pelos matizes cinzas da trágica história que nos precede, reverberou entre as épocas coloniais, a ditadura militar dos anos 60 e 70, e o covarde golpe capital, selvagem e voraz da neo liberação que hoje resulta na parte mesquinha de uma nação. Mas nos lineares da história recente e paulatinamente, escreveram-se os capítulos mais lindos e impossíveis, jamais lidos no livro da vida dos brasileiros, onde um povo, cansado de sofrer com a hegemonia ditatorial da escravidão e o preconceito, manifestou-se de verdade e mudou uma história que adormecia a mais de 500 anos.

Desde os anos oitenta em meio ao turbilhão e a intoxicação que meio capital tomava, à deriva de trotes desenfreados, nascia o PT, o mesmo que hoje é aclamado como vilão dos partidos, vinha naquele então, mudar a história de um país em decadência moral, onde a fome o punha no mapa do quarto mundo, sucumbindo à miséria. Pois bem que se diga, a construção de uma nova ordem social e um novo modelo político de inclusão foi criada por esse mesmo PT, um socialista de vanguarda com forte apelo popular que articulou-se entre as traumáticas lembranças da ditadura e que viria a repartir igualdade para mais de 50 milhões de brasileiros, 50 vezes mais que o público de domingo passado. Estamos falando de mais de cinquenta milhões de famintos e indigentes, contra um milhão de pessoas que nunca estiveram na faixa da miséria, apenas da pobreza (de espírito) cinquenta para um, na língua e na síntese das comparações. Entretanto e não mais tanto, mas voltando a aberração do dia 15, tivemos por parte do público participante um festival de contradições que demonstra não só para nós, mas sim para o mundo, de como somos ignorantes, no alto da palavra, pois mesmo com uma vergonha alheia semelhante ao tamanho da pátria, tivemos que participar, mesmo que indireta ou contrariamente, da exposição, ao cume do ridículo. A população de pseudo manifestantes que tiraram sua bunda do sofá e saíram a abençoar suas cabecinhas pelo clero, não contentou-se em vestir a camiseta que não vestiu na copa, a da CBF, instituição publicamente torrada pela corrupção, e gritou contra a corrupção, mas também gritou com muito orgulho à volta da ditadura, enquanto procurava-se desesperadamente pela miscigenação das raças, mestiços, pardos, negros, sararás, latino brasileiros, por que será? Será que há de se pensar, ou é pura implicância? Total né, o que importam os genocídios que criaram o braço forte da identidade do país né?


Enquanto isso crianças carregavam faixas e cartazes com a mesma falta de ortografia dos pais, e misturavam frases que não faziam sentido que até pro Paulo Freire sobrou, e pro Aguinaldo Rossi. Dispensa comentários, os curiosos que procurem no google. Mas os gritos que mais se ouviam, além do fora PT, eram entrelaçados pela volta do regime militar e a democracia, sem dar-se de conta que um não casa com o outro, se não houvesse democracia e houvesse regime, estariam todos presos pelas besteiras, pelas ofensas e pela singela e ingênua liberdade de expressão facebookeana. Logo torturados, logo, isca de tubarão. Mas os absurdos não param por aí, houve tenebrosos grupos de apoio à passeata, e os mesmos candidatos eleitos em prol da homofobia entre outros pré-conceitos estavam lá, então quando se levanta uma bandeira está se apoiando a passeata toda, entre cúmplices que se entendam. Não se viu uma bandeira sequer implorando pela falta de água, o ouro cristalino não entrou na lista das exigências, que raro não? Chorou-se por gasolina, mas não caiu uma lágrima quando o assunto era fome, não importa. Esse é o povo do terceiro turno, o povo que inventou uma forma de não sair perdendo, o povo que, quer fazer que todos, até os vitoriosos percamos. O terceiro turno foi o mais visto, acompanhado, foi o mais pop, foi um ato político, social, de revolta, de certezas e incertezas. O terceiro turno tinha cara de gol, de grito final, de revanche, de vingança, de prato frio. Mas voltando aos números...que coisa linda, os números, num melhor de 3 é que nem jogo de truco, la primera en casa, depois é só matar a segunda, num terceiro turno não chega nem a ser amistoso, é voto nulo, perdeu playboy, em tua língua? Game Over.

Edição de 18/03/2015  Ano IV nº 204



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