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terça-feira, 11 de agosto de 2015

Coluna Gente Fronteiriça - À cerca das cercas!

Por Magnum Patrón Sória

Dos moirões antigos da casa grande ou das pedras crespas das senzalas, surgem elas, como serpentes esgueiradas ou pautas sonoras, ribombando os tantos mandados que por elas exibem suas forças e balbuciam as tormentas vindas de más allá! As cercas! 

Demarcam a fronteira entre o é e o devir, entre o está e o já foi, entre o que tem com o que perdeu ou nem teve tempo de compreender! Nelas paixões fugidias entre maragatos e chimangos, entre as negras e os restos indígenas que ainda haviam nestas bandas do Jaguarú Grande! Fim da linha para os brancos em guerra, possessos de posse! Algumas marcam ainda os ideais de liberdade privada, outras guarnecem os fétidos e obscuros tenebrosos momentos de roubos e soberbas. Formam varais na campanha, brincadeira de guri, alívio das coceiras dos cavalos e vacas! Tornam-se apoio do descanso das bergamotas do pós-almoço charrua! Aliviam heranças e mantém patrimônios e quando atravessadas, matrimônios ou traições e infortúnios, depende do passo que te dão. Na fronteira dos idos, no presente dos vetos. Testemunharam a força das sesmarias, dos governos nos campos neutrais, das coroas endoidecidas de uma época confusa, não mui diferente de hoje! E aqueles que te fizeram... guapos e teimosos! Homens de dor, de feridas sangrentas, alimentados pelo sol escaldante de janeiro ou de geadas no bruto frio destes meridianos. 

Quantos amores ficaram gravados nas tábuas que te mantém aramada! Que corações empedrados ainda assombram as antigas senzalas, ou iluminam potes de moedas antigas nas noites de lua cheia, ou emudecem uma cultura calada pela segregação, ou trazem os fantasmas das noivas que perderam seus alambradores! Velhas cercas da fronteira! Moirões apodrecidos! Arames ferrugentos. Contem as histórias desta gente mesclada, deste povo valente, que foge da mesmidade do pampa. Abram as porteiras do esquecido e embretem as ilusões que anestesiam os viventes da realidade. Sejam mais como as cercas das casas das cidades: onde a vizinhança se faz mais próxima, onde há lugar para o prato das sobras para os que não tem nem migalhas. E assim, solidariedade e humanidade serão teus alambrados e tuas tábuas, os piques de vida feliz. 

Edição de 06/08/2015 Ano VI nº 224


 

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