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terça-feira, 7 de julho de 2015

Redução da maioridade penal: solução contra a criminalidade ou isenção da responsabilidade do estado?

Está em pauta no Congresso Nacional a PEC 171 que prevê que jovens com idade acima de 16 anos que cometerem crimes possam ser condenados a cumprir pena numa prisão comum. O tema é debate na sociedade, onde grupos se dividem a favor e contra a medida.

A PEC 171 foi apresentada em agosto de 1993 e passou mais de 20 anos parada. Recentemente retornou ao centro dos debates no Congresso Nacional, que tem uma característica conservadora alinhada a partidos da direita brasileira.

A admissibilidade da proposta foi votada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados em 31 de março. Foi o primeiro passo para o andamento da proposta na Casa, em que os deputados avaliaram que o texto está de acordo com a própria Constituição. Os líderes do PRB, PSD e PR, orientaram os deputados a votarem a favor da PEC. Na oposição, pediram votos pela admissibilidade da proposta líderes do PSDB, DEM e SD. PMDB, PDT e PROS liberaram a bancada. Votaram contra PT, PC do B, PSOL, PPS e PSB.

Na terça-feira (30) estudantes marcharam até o Congresso Nacional para protestar contra a proposta de emenda à Constituição. Cerca de 5 mil jovens, representantes das mais diversas organizações, como União Nacional dos Estudantes, a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas e movimentos como Amanhecer Contra a Redução, Levante Popular da Juventude, Anistia Internacional e Fora do Eixo estiveram durante todo o dia na Esplanada.

ONU reafirma posição contra redução da maioridade penal no Brasil

A ONU reafirmou na segunda-feira (29) posição contrária à proposta de redução da idade penal de 18 para 16 anos. “Se as infrações cometidas por adolescentes e jovens forem tratadas exclusivamente como uma questão de segurança pública e não como um indicador de restrição de acesso a direitos fundamentais, o problema da violência no Brasil poderá ser agravado, com graves consequências no presente e futuro”, explica a entidade em nota publicada em seu site.

A entidade defendeu que o desenvolvimento de políticas públicas relacionadas ao Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo e de desenvolvimento humano e social para crianças e adolescentes poderia ser muito mais efetiva ao responder às preocupações da população em questões de segurança pública, “resultando em benefícios para toda a sociedade”. “A violência, em sendo um fenômeno de múltiplas causas, demanda, para sua solução, a adoção de políticas públicas de segurança cidadã com abordagem integral”, continuou a nota.

Retomando estatísticas sobre a realidade social, educacional e econômica dos adolescentes em conflito com a lei, a ONU ressaltou que a redução da maioridade penal contraria os preceitos para o fortalecimento das trajetórias de adolescentes e jovens, “representando um retrocesso aos direitos humanos, à justiça social e ao desenvolvimento socioeconômico do país”. A Nações Unidas já havia se posicionado contra a redução da maioridade penal em 11 de maio deste ano.

Para a entidade aumentar o encarceramento não vai resolver o problema da violência. “A violência, em sendo um fenômeno de múltiplas causas, demanda, para sua solução, a adoção de políticas públicas de segurança cidadã com abordagem integral”, destacou.

Estudos recentes do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) e do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), indicam que a maior parte dos adolescentes cumprindo medidas de internação apresentavam baixa escolaridade, abandono escolar, grave situação de pobreza, entre outras características que indicam contextos de vulnerabilidade social e/ou de violação de direitos.

Além disso, a carta da ONU destaca que entre o total de adolescentes brasileiros entre 12 e 18 anos, 38% “viviam em situação de pobreza”. “No campo educacional, 1,6 milhão de adolescentes entre 15 e 17 anos estavam fora da escola em 2013 e, neste período, apenas 54% conseguiram concluir o ensino médio até os 19 anos”, segue o documento, que destaca ainda a dificuldade dos jovens em encontrar trabalho e os baixos salários pagos a eles.

“Quando o Estado provê meios, condições e oportunidades para que adolescentes e jovens acessem seus direitos, diminui a vulnerabilidade social vivenciada por eles/elas, suas famílias e comunidades, reduzindo drasticamente os riscos de infração. Possibilita a quebra dos ciclos intergeracionais de violência e pobreza e a redução das situações de violência e negligência social que podem estar relacionadas ao ato infracional”, diz a nota.

Também é lembrado que, apesar de serem tidos como os principais responsáveis pela violência e os crimes graves no país, adolescentes são mais vítimas do que autores. Dados oficiais mostram que, dos 21 milhões de adolescentes que vivem no Brasil, 0,013% cometeu atos contra a vida, ao passo que os homicídios são a causa de 36,5% das mortes de adolescentes.

De acordo com o último Mapa da Violência, estudo realizado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz, da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso), dez adolescentes de 16 e 17 anos foram mortos por dia, em 2013. Um total de 3.749 jovens vítimas de homicídio.


A ONU destacou ainda que a PEC 171 fere acordos de direitos humanos e compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, como a Convenção sobre os Direitos da Criança e do Adolescente, ratificada pelo país em 1990.

Edição de 02/07/2015 Ano VI nº 219




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