Uma das recentes
manchetes da nossa grande mídia nacional é uma provável convocação
de um ex-presidente para depor em uma CPI da Câmara que está
tratando – concomitantemente com a Justiça Federal – das
questões relacionadas com a já conhecida Operação “Lava Jato”,
uma das últimas tarefas das que vêm sendo encetadas pela nossa
operosa Polícia Federal. O estranho não é a convocação. É muito
natural, em um País democrático, que alguém tenha que se
pronunciar quando sobre ele pese algum tipo de suspeita de mal-feito
que venha em prejuízo da sociedade como um todo. O inusitado do caso
é a motivação pelo qual se pretende convocar a ex-autoridade. A
motivação seria porque um delator premiado (figura muito em voga
ultimamente) em uma de seus tantos pronunciamentos relatando a sua
participação na tramoia, declarou “Suponho que o ex-presidente
soubesse”.
A valer a justificativa
para que se lance uma dúvida sobre qualquer pessoa a ponto de
convocá-la para prestar declarações, poderíamos acabar caindo na
seguinte conclusão: uma suposição pode produzir até uma situação
de suspeita para quem sofreu um comentário por parte de quem quer
seja. A partir de então precisaríamos ter cuidado com qualquer
expressão que algum desconhecido usasse referindo-se a um provável
comportamento nosso com base apenas em uma suposição.
Seguindo essa linha,
atrevo-me a, também, fazer umas suposições. Por exemplo eu poderia
dizer: “As empresas X e Y foram citadas na Operação Zelotes. Eu
suponho que elas sejam corruptas”. Poderia concluir isso? Não. De
maneira alguma!. Não há – ao menos até agora - nenhuma decisão
de justiça que me autorize a pensar isso. Eu seria um inconseqüente
se fizesse tal afirmação sem que houvesse uma decisão final que as
condenassem. Querem outro exemplo? Naquela operação que
acabou com a prisão de Carlos Cachoeira e a cassação do senador
Demóstenes, um dos diretores da Revista Veja foi notado porque
realizara mais de 200 ligações para o doleiro. Posso supor que ele
ou a revista que ele representava também estavam envolvidos na
trama? Não! Ainda mais que as investigações não mencionaram mais
o assunto. Posso supor, apenas, que os contatos poderiam ser somente
sobre assuntos triviais como falar sobre o tempo ou combinar alguma
pescaria entre amigos. Quando a honra das pessoas está em jogo
devemos ter um compromisso conosco mesmos de termos o maior cuidado
com aquilo que concluímos. Há um ditado oriental que lembra que uma
palavra e uma seta depois de disparada não voltam mais a sua origem.
Não estou querendo
dizer com isto que escrevi que atribuo culpa ou inocência a qualquer
dos envolvidos. Não é o quero debater. Lembro aqui a decisão da
nossa mais alta Corte de Justiça que condenou os réus do famoso
processo do mensalão, após amplos debates, utilizando a teoria do
domínio do fato, que condena “sem provas”. Que me perdoem suas
excelências, mas a sociedade é que perdeu uma excelente
oportunidade de saber realmente se aquelas pessoas eram culpadas ou
inocentes. Se elas mereciam ou não a confiança que lhes fora
depositada. Pior: nunca mais saberemos. A não ser que um dia, algum
sábio resolva ir até as últimas conseqüências e, mesmo assim, a
justiça já terá sido feita (se forem culpados) ou a injustiça já
terá sido cometida (se forem inocentes). Eu penso que uma decisão
mais política do que jurídica jogou a questão em um beco sem
saída. Os julgadores quiseram atender uma pretensa voz da opinião
pública açulada pela mídia contrária ao governo ao qual
pertenciam alguns dos acusados.
As decisões a serem
tomadas em tempos difíceis são, também, difíceis. Entre as
difíceis estão as possíveis e as não-possíveis. As escolhas são
sempre humanas e, por mais, qualificação que se tenha sempre
podemos errar. O importante nestes momentos é que haja muito debate
sem que as partes decidam, a priori, que apenas uma das partes pode
ganhar e que a outra perca tudo.
Ficam aqui estas
considerações e que os leitores possam chegar, também, a suas
próprias conclusões. O desejável é que cheguemos ao nosso
posicionamento a partir de um contraditório que nos deve ser
apresentado sem nenhuma escamoteação midiática.