O sujeito trabalha toda a vida, mais do que vive, do que dorme, do
que descansa, do que aproveita, e quando completa várias décadas de
função trabalhista se aposenta. Já velho, cansado, e com
dificuldades físicas procura um lugar tranquilo para curtir a
aposentadoria, na minha opinião, para esperar a morte. Seguimos à
risca esses padrões sociais que nos implantaram desde sei lá que
época que tempo. Não pesquisei sobre isso, não achei necessário
estudar aquilo que está tão presente aos olhos leigos. Deixamos de
viver a vida que queremos e achamos que queremos viver a vida que
temos de uma forma geral claro. Atividades de aposentado bon vivant
que podemos tê-las sempre, deixamos para depois com o intuito de
felicidade, só que não, como se escreve atualmente no dialeto
virtual.
Pensamos em fugir das cidades, do barulho, das tensões, e
das pulsações urbanas, procuramos descanso, sossego, procuramos o
fim. E daí vem aquela velha frase: já criei meus filhos, os formei,
os casei, agora posso morrer em paz. Ou seja, perpetuamos esses
ensinamentos em nossas famílias e desenhamos nossa própria triste
história. Deixamos de viver uma vida jovem ou jovial, para que me
entendam melhor, e nos vestimos de velhice, tal qual mandam os
padrões. Adiamos práticas saudáveis para a mente e o corpo pela
falta de tempo, aquele mesmo tempo mal aproveitado que nos pertence,
mas que não sabemos administrá-lo. Comemos mal para depois
enchermo-nos de remédios e entrar no jogo macabro da máfia
alopática. Entre outros hábitos gastamos mais de 50 % da nossa vida
naquilo que nos imporão e nos impomos, quase sempre em frente aquela
telinha que faz plim plim, plim plac ou plim plum, somos verdadeiros
escravos do consumismo e da caretice social. É claro que as rotinas
nos dão segurança, estabilidade, coesão com nossas naturezas
vitais, mas também nos encolhem como seres humanos, não medimos a
dádiva de viver e não percebemos o quão longe nossos braços e
nossa alma possam alcançar, o quanto podemos explorar deste lindo
mundo que ganhamos e muito menos percebemos que, a felicidade, ou a
liberdade, estão ali, na esquina, na volta de casa, ao lado, e se há
e se existe, devemos pegá-la.
Hoje e sempre tento levar a vida que
quero que me pertença, não espero encher os cabelos de fios brancos
para cultivar minha horta, para escutar meu vinil, ou para passear de
bicicleta e contemplar as coisas mais simples que a natureza nos
propõe. Não espero a velhice, ela que me espera, em algum lugar
remoto que hoje imagino, mas não planejo, pois devo planejar o dia
de hoje, devo viajar amanhã, e devo aproveitar ontem. Nessa teoria
de pensamento me remeto à loucura de viver e a adrenalina que vamos
perdendo enquanto ficamos enferrujados. Ou quando crianças não
girávamos até ficarmos tontos? Nosso corpo e espirito andam de mãos
dadas com essa força vital que perdemos aos poucos, enquanto
assinamos nosso contrato de velho a vida passa sem passarmos por ela.
Vivamos ao contrário, morrer para nascer, matar nossas preguiças e
reviver nossas andanças, boicotar nossas rotinas e caminhar ao luar,
sabotar as datas chatas e comemorativas, não os aniversários ou
datas especiais que nos aproximam do nosso, mas sim esses calendários
consumistas que nos obrigam às compras e a futilidade da união em
volta do objeto, do dinheiro, e não em volta à vida. A vida, essa
mesma, é muito mais do que isso, sejamos subversivos, na maneira de
enfrentar os problemas, de amar o próximo, de respeitar a criança
que somos e o velho que seremos, pois enquanto isso a vida passa como
um flashback, uma deja vu. Bora lá caminhar por aí, visitar os
lugares mais desejados, dizer, enquanto é tempo, o quanto amamos
isso tudo, mergulhar no abismo da inconsciência. Voar pelos livros
jamais lidos, dedicar canções, comprar flores para si, abrir a
mente, arejar a casa das ideias, viver para viver. A todos uma
excelente continuação de semana e a proposta de fazer coisas
diferentes e não envelhecer embalsamado na cadeira de balanço da
varanda, empalhados na cadeira de balanço da vida.