Por
Mário Maestri*
Em 13 de maio, a Abolição celebrou
123 anos. O Brasil foi uma das primeiras nações americanas a
instituir e a última a abolir a escravidão. Dos 511 anos de
história do Brasil, mais de 350 passaram-se sob o látego negreiro.
A Abolição já foi celebrada com vigor e alegria. Hoje, conhece
verdadeira desqualificação. Sua negação é obra sobretudo do
movimento negro organizado que com razão lembra a miséria atual de
grande parte do povo negro. Essa visão bem intencionada consolida
interpretações caricaturais do 13 de Maio que escamoteiam a
essência da gloriosa revolução abolicionista de 1888.
Celebrar o 13 de Maio não significa
reafirmar os mitos da emancipação do negro em 1888 ou de Isabel
como Redentora. Significa recuperar a importância da superação da
escravidão e da participação dos trabalhadores escravizados
naquelas jornadas revolucionárias. O povo negro pobre sempre intuiu
a importância de 1888. Esse sentimento profundo não nascia da
propaganda das classes dominantes, mas da memória popular sobre
acontecimento magno para os subalternizados.
Não há sentido em antepor o 20 de
Novembro, celebração da confederação dos quilombos de Palmares,
ao 13 de Maio, fim da escravidão. Apesar de saga luminar, Palmares
jamais propôs – e não podia ter proposto – a destruição da
escravidão como um todo. E foi derrotado. A revolução
abolicionista, movimento nacional, foi vitoriosa ao superar para
sempre o escravismo. Desconhecer o seu sentido revolucionário é
menosprezar a essência escravista do passado e o caráter singular
da gênese do Brasil.
Estudos clássicos como Os últimos
anos da escravatura no Brasil, de Robert Conrad, apresentam a
Abolição, em seu tempo conjuntural, como produto do abandono maciço
pelos cativos das fazendas cafeicultoras, sobretudo paulistas, nos
meses finais de cativeiro. Um movimento que se impôs sob uma tensão
extrema, que ceifou a vida de não poucos cativos e abolicionistas
consequentes.
O fim do cativeiro deveu-se à massa
escravizada, aliada aos abolicionistas radicalizados. Em 13 de maio,
a herdeira imperial apenas sancionou lei aprovada pelo Parlamento dos
proprietários, lavrando o atestado de óbito de instituição
terminal. Nos 66 anos anteriores, os Braganças haviam defendido o
cativeiro, com dentes e unhas.
Em um sentido estrutural, foi
sobretudo a oposição permanente do cativo ao trabalho feitorizado
que construiu as condições que levaram, mais tarde, à destruição
da escravidão. Uma oposição que impôs limites insuperáveis ao
desenvolvimento tecnológico da produção, determinando gastos de
vigilância e coerção que terminaram abrindo espaço para formas de
produção superiores.
Em 1888, pôs-se fim ao modo de
produção escravista colonial que ordenara o Brasil por mais de 300
anos. É um anacronismo negar essa realidade devido às condições
econômicas, passadas ou atuais, da população negra. Os limites da
Abolição eram objetivos. No final da escravidão, a classe servil
era categoria em declínio que lutava essencialmente pelos direitos
cidadãos, reivindicação que uniu trabalhadores escravizados rurais
e urbanos. Em 13 de maio, setecentos mil cativos e ventre-livres
obtiveram a liberdade civil.
O programa abolicionista de
modernização e democratização do país continha a distribuição
de terras entre os ex-cativos e os pobres. O movimento abolicionista
foi desorganizado pelo golpe republicano de novembro de 1889, que
entregou o poder às classes proprietárias regionais.
Com o 13 de maio, superavam-se as
diferenças entre trabalhadores livres e escravizados, iniciando-se a
história da classe operária como a compreendemos hoje. A revolução
abolicionista foi o primeiro grande movimento de massas do Brasil e
constitui, até agora, a única revolução social indiscutivelmente
vitoriosa no país.
*
Prof. do Curso
de História e do PPGH da UPF –
Artigo publicado pelo diarioliberdade.org
em 15/05/2011
Edição de 13/05/2015 Ano VI nº 212
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