O Grupo
RBS, a Gerdau, os bancos Bradesco, Santander, Safra, Pontual e Bank
Boston, as montadoras Ford e Mitsubishi e um grupo de outras grandes
empresas estão sendo investigados pela suspeita de pagamento de
propina a integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais
(CARF), para anular multas tributárias milionárias. A revelação
foi feita neste sábado (28) pelo jornal O Estado de São Paulo em
uma matéria sobre as investigações em curso na Operação Zelotes,
desencadeada na última quinta-feira (26) por diversos órgãos
federais para desbaratar um esquema de fraudes tributárias
envolvendo grandes empresas brasileiras e multinacionais. As
investigações são conduzidas por uma força-tarefa formada pela
Receita Federal, Polícia Federal, Ministério Público Federal e
Corregedoria do Ministério da Fazenda.
Entre os crimes investigados na Zelotes, estão advocacia
administrativa, tráfico de influência, corrupção, associação
criminosa e lavagem de dinheiro. Segundo nota divulgada pelo
Ministério da Fazenda, “o esquema envolveria a contratação de
empresas de consultoria que, mediante trânsito facilitado junto ao
CARF, conseguiam controlar o resultado do julgamento de forma a
favorecer o contribuinte autuado. Constatou-se que muitas dessas
consultorias tinham como sócios conselheiros ou ex-conselheiros do
CARF”. “O termo ZELOTES, que empresta nome à Operação”,
disse ainda a Fazenda, “tem como significado o falso zelo ou
cuidado fingido. Refere-se a alguns conselheiros julgadores do CARF
que não viriam atuando com o zelo e a imparcialidade necessárias”.
Existem
“indícios veementes”, diz delegado
Segundo a
Polícia Federal, o grupo que atuava no CARF fazia um levantamento
dos grandes processos em curso no conselho, procurava empresas com
altos débitos no Fisco e oferecia facilidades, como a anulação de
multas. Conforme as investigações feitas até aqui, mais de 70
processos tributários podem ter sido fraudados, com um prejuízo
superior a R$ 19 bilhões aos cofres públicos. O delegado da Polícia
Federal Marlon Cajado, responsável pelas investigações, afirmou à
Agência Brasil que até o momento foram identificados “indícios
veementes” de manipulação de cinco julgamentos, já finalizados,
em que o Estado foi lesado em quase R$ 6 bilhões. O delegado Oslain
Campos Santana, diretor de Combate ao Crime Organizado da PF, disse à
revista Veja que “essa investigação é uma das maiores, se não a
maior, de uma organização criminosa especializada em sonegação
fiscal no Brasil, pelos valores e pelo modus operandi”.
O CARF é
um órgão da Fazenda onde contribuintes podem contestar
administrativamente tributos e multas aplicadas pela Receita Federal.
A matéria do Estadão cita uma conversa interceptada com autorização
da Justiça, onde um ex-conselheiro do CARF diz: “Aqui no CARF só
os pequenos devedores pagam. Os grandes, não”. A fórmula para
isso acontecer envolveria, entre outras coisas, o pagamento de
propinas a integrantes do conselho para fazer as multas
desaparecerem.
Investigadores
suspeitam que RBS pagou R$ 15 milhões de propina
Os casos
que estão sob investigação da força-tarefa da Operação Zelotes
teriam ocorrido entre os anos de 2005 e 2015. A investigação,
iniciada no fim de 2013, analisou o comportamento de conselheiros do
CARF e de escritórios de advocacia suspeitos de operar dentro do
conselho e de terem causado prejuízos estimados em quase R$ 6
bilhões aos cofres públicos. Já foram examinados 70 processos em
andamento ou já encerrados no Conselho. Ainda segundo o jornal O
Estado de São Paulo, os investigadores suspeitam que a RBS teriam
efetuado o pagamento de R$ 15 milhões de reais para fazer
desaparecer um débito de mais de R$ 150 milhões de reais. No total,
diz também a reportagem, as investigações se concentram em débitos
da RBS que chegam a R$ 672 milhões.
O Grupo
RBS divulgou nota oficial neste sábado dizendo que desconhece a
investigação da Operação Zelotes e negando qualquer
irregularidade em suas relações com a Receita Federal. “A RBS não
foi procurada para fornecer qualquer informação sobre a suposta
investigação e confia na atuação das instituições responsáveis
pela apuração para o devido esclarecimento dos fatos, que, como
sempre, seguirão tendo cobertura normal de nossos veículos”,
afirma a nota publicada na página institucional do grupo. A empresa
também transmitiu “a todos os seus colaboradores a sua total
tranquilidade quanto à lisura e à transparência dos procedimentos
junto ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), bem como
em todos os seus atos externos e internos em todas as áreas”.
Gerdau
investigado pela suspeita de tentar anular débito de R$ 1,2 bi
O Grupo
Gerdau também é investigado pela suposta tentativa de anular
débitos que chegariam a R$ 1,2 bilhão. Entre as empresas
mencionadas na matéria do Estado de São Paulo, os maiores débitos
foram os discutidos por Santander, com R$ 3,3 bilhões, Banco
Bradesco e Bradesco Saúde, com R$ 2,7 bilhões e Ford, com R$ 1,7
bilhão. Dos grupos gaúchos, Gerdau aparece com R$ 1,2 bilhão, RBS
com R$ 672 milhões e Marcopolo com R$ 260 milhões. Até a tarde
deste sábado, o Grupo Gerdau não havia se manifestado oficialmente
sobre o caso. O Ministério da Fazenda informou que já abriu
processos administrativos contras as empresas envolvidas, tendo como
base a Lei Anticorrupção. Essas ações, ainda segundo a Fazenda,
“têm em vista a aplicação das medidas administrativas punitivas
pertinentes, sem prejuízo da eventual responsabilização civil e
penal”.
O
Ministério da Fazenda também informou que, “desde o começo de
2015, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, órgão
responsável pelo julgamento dos contenciosos administrativos fiscais
de segunda instância, iniciou uma reforma dos seus processos
internos, com vistas a aprimorar suas atividades, dando-lhes maior
transparência, previsibilidade, celeridade e segurança”. O
Procurador da República Frederico Paiva, que atua na Operação
Zelotes, disse à Agência Brasil que o CARF tem um modelo de
composição e atuação que é “suscetível à corrupção”.
Vinculado ao Ministério da Fazenda, o CARF é composto por 216
conselheiros, sendo 113 indicados pelo Ministério da Fazenda e 113
por confederações representativas de categorias econômicas de
nível nacional e pelas centrais sindicais. O trabalho dos
conselheiros não é remunerado.
“Estamos
falando de grandes advogados, experientes que, obviamente, não vão
ficar três anos afastados sem remuneração. O sistema é
naturalmente falho, tem que ser mudado e esperamos que o Ministério
da Fazenda tome as providências. Neste momento de ajuste fiscal, em
que se busca receitas, o CARF é um grande escoadouro de recursos
públicos. Isso é de conhecimento público, pelo menos dos grandes
escritórios de advocacia”, disse ainda Frederico Paiva.
Matéria
reproduzida do site Sul 21 por Marcos Weissheimer
Edição
de 01/04/2015 Ano IV nº 206